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Variações em vanitas, de J. P. Oliveira

Variações em vanitas, de J. P. Oliveira

Eu nunca tinha levado a sério a ideia de relógio biológico. Até ele ir embora.

 

Mas, pensando bem, tem menos a ver com ele que com a minha recente obsessão com o tempo.

Sobre ele, posso dizer que gostei dos seus olhos. Pareciam olhar ao longe, diferente dos outros caras, que mantinham a visão nos planos mais básicos. Especificamente, meu corpo.

Mas seus olhos de horizonte não duravam muito. Veja, ele é bancário. Isso era vantajoso para mim, porque depois que larguei do meu último emprego não precisei me preocupar com outro já que ele fazia questão de cuidar de tudo, então passei a encher a casa com a minha paixão nos quadros e materiais de pintura. Ele não gostava muito dos quadros, ou a palavra é "desaprovava". Especialmente os que me mostravam nua, que pintaria por vezes sentada em frente ao espelho, dando ênfase a cor de todos os lábios, ou o enrijecer dos mamilos, ou o brilho das nádegas em poses de lado, com o cabelo caindo pelas costas. Eu estudava nos quadros o corpo dele também, mas tinha que pinta-lo em segredo e ele só os via quando descobria sem querer atrás de outros num quarto. Discutíamos sobre isso. Principalmente quando deixava clara minha intenção de eventualmente exibi-los por aí e ele chegava a enrubescer, e não era só de raiva.

 

Pra agradá-lo e até expandir meu conteúdo, resolvi tentar natureza morta, mas ele mesmo me mostrou o quanto ainda eram eróticas. Tulipas rosas e úmidas, laranjas de bicos durinhos, maças brilhantes e arredondadas.

Um dia me disse que seria transferido pra um banco em outro estado e, depois de uma noite de conversas tristes, decidi ficar pra continuar as aulas na escola de arte e sabíamos que a distância era um peso que de qualquer jeito nos esmagaria.

Apesar de sexo estar sempre nas obras, estava só ocasionalmente na vida e não tivemos filhos. Minha experiência maternal vinha na forma de uma menina rosada e cheirosa que minha irmã teve 10 anos antes e que me dava de presente em alguns fins de semana.

Ela não tinha permissão pra ver minhas pinturas, de acordo com a mãe, mas nem se interessava tanto já que o que queria mesmo era minha comida.

  • Sobre o autor:

    João Paulo Oliveira é natural de Ponta Grossa, PR. Publicou os livros Baratas de Hiroshima (2015), Village Hotel Blues (2016), Punhado de cinzas (2017) e O formato da nossa decepção (2020). É romancista, contista e poeta.

  • Informações do produto:

    Capa comum: 210 páginas

    Editora Libertinagem: 1ª edição

    São Paulo, agosto de 2025

    Formato 14x21cm

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