Madalena, de Caroline Diniz

Leia abaixo três poemas de "Madalena", de Caroline Diniz:
 
Carne de Dentro

desnuda-me, 
ó meu
lado avesso. 
carne de dentro
rui ao maior lamento: 
daí afago, daí alento 
pro buraco deste peito.
Flanco trêmulo 
denuncia
dor latente, 
que espicha 
impertinente. 
Urgentemente,
virai-me do lado avesso!
 
***
 
Bicho

Sou um bicho melancólico demais pra fumar acompanhado.
Já me custa tanto sorrir-lhe à mesa do café sabendo que o dia seguirá automático.
E nessa solidão desenfreada, o que me consola no ônibus lotado é justamente o cheiro de sovaco.
O que ainda não se diagnosticou é que falo pelo cotovelo e meu sentimento é todo calado.
E pelas velhas lentes arranhadas desse óculos, eu comunico o meu desatino pelas cordas do cavaco.
Ah! Não há palavra que designe o ser-se de um bicho do mato.
 
***
 
Santa Decadência

Minha Santa Decadência 
me salva desse teu deslumbre
sobre Mim.
Minha Santa Decadência 
liberta, afrouxa essas amarras 
no Eu passado.
Tenho tempo demais para me repetir.
Minha Santa Decadência 
me desobriga
de seguir roteiros alheios 
destinados ao curta-vida de minha Existência.
Minha Santa Decadência
tá incrustada na carne e na alma.
É uma puta que
se dança, se lambuza, se impregna buscando a rabo de olho alguma quota de essência
bebe e desbebe incessantemente
transcendentalidades de minha pessoa.
Minha Santa Decadência
me torna o Eu
de antes, de agora e do que há talvez de vir.