Macabea

Entre este caos: a calmaria de desabotoar-te a camisa e lentamente pousar
meu ouvido em teu peito para ouvir o pulsar aprisionado do teu coração, à
espera de que o libertes.
Penso se tu dormes neste instante.
Presencio teu sono e encontro o compasso da tua respiração. Sopro-te aos
ouvidos, como um mantra antigo: Einmal ist keinmal, que agora aprendi a
pronunciar, e tu acordas em sobressalto porque reconhece o som da vida
adormecida à espera do pulso deste agora, insistindo em Viver. Acordas para
em seguida te deitares ao encontro dos meus-teus desejos. E nós nos
contemplamos, despertando tempestades.
Eu adormeci, sem querer, numa curiosa quietude, segurando as minhas mãos
depois de tê-lo encontrado no ideal do pensamento que não se curva ao corpo
mas o desprende dos espaços terrenos para iluminar-se. Acordei com a chuva
e com a fome da tua presença.
Preservo o teu gosto.
É de Ambrósia tua saliva. Constatei. E mesmo o outono dos teus olhos faz
florescer.
Dissestes, como se perguntasse a si mesmo "Por que só agora?" E
respondestes: "Era para ser assim", como se soubesses o quê e quando tem
de acontecer. Deixa pulsar a liberdade. O controle do destino afasta a dádiva
que encontra o presente, impetuosamente apenas o que temos. Procuramos
encontrar o nascimento da centelha deste fogo que nos habita, é, talvez,
essência de saudade de nós mesmos, já que nos diluímos lentamente no
correr pontual da rotina. É talvez outra cousa desconhecida. Heteróclito
submerso à pele, mas nós mergulharemos: buscaremos sempre o encontro à
nossa própria face, refletida no olhar de outrém. 
Preservo teu gosto como quem sabe do espinho cravado à unha, e, antes de o
tirar, aprofunda-o ainda mais.