Galope em Campo Minado, de Amanda Leal
Leia abaixo três poemas de "Galope em campo minado", livro de poemas da multiartista Amanda Leal:
transição
o olho virado pra dentro
enxerga o revés
o invisível
através de outro sentido
e inverte tudo que vocês criaram
às vezes eu acho que
quase ninguém entende
mas eu posso desenhar
a víscera existe mais quando exposta
sob o olhar estupefato de quem a encontra
se debatendo no chão
na esquina do sem fim
há algo que escapa
e me diz
que essa víscera ainda vai comer vocês
e tudo vai ser avesso
porque nenhum passado morre em silêncio
***
tudo aquilo que não entendemos chamamos de
monstro
dorme o silêncio
na cama do céu da boca
se enrola na língua
confunde o sino e o nó
em “cosquinhas” na garganta
dorme profundo e intranquilo
aquilo que não se sabe de si
o outro é sempre um olho
outre que é sempre turvo
como um espelho sujo
uma sombra talvez um monstro
que vive embaixo da cama
haverá sempre aquilo que não entendemos
tudo que escapa
ao juízo e à norma
mas às vezes
basta acender
a luz
***
clitóris
você que me vê
pode me ouvir?
você que me ouve
pode me sentir?
você que me sente
pode me tocar?
você que me toca
pode me entender?
você que me entende
pode me reconhecer?
você que me reconhece
pode me aceitar?
você que me aceita
pode me respeitar?
você que me respeita
pode me acolher?
você que me acolhe
pode me amar?
você que me ama
pode me chupar?
você que me chupa
pode me ler?